Minhas tardes eram todas iguais. Mal eu punha
os pés na sala, já era recebida por aquele “bom dia!” super empolgado, aquele
“tudo bem?” respondido no automático e aquele abraço apertado. Usualmente
morrendo de sono, ia arrastando os pés para qualquer canto onde houvesse uma cadeira decente para chamar de minha. Havia uma espécie de competição
de arremesso de bolsas: ganhava quem primeiro pusesse a sua no lugar
pretendido. A isso se seguia a competição de quem tem mais material para
espalhar em volta e guardar o lugar dos amigos. Sempre igual.
Depois de garantido o lugar, migrava para a região onde o grupo estivesse
aglomerado ou ia conversar com alguém isolado, dependendo do meu estado de espírito.
Falávamos sobre os episódios das séries da semana. Trocávamos ideias sobre bons
livros, bons filmes e boas músicas. Tentávamos obrigar os outros a lerem ou
assistirem o que gostávamos, porque queríamos ter com quem comentar. Tínhamos
opiniões diferentes sobre tudo. Sempre nos envolvíamos em discussões
filosóficas, conversas inteligentes, conversas idiotas e brigas, muitas brigas,
quase sempre desnecessárias. Às vezes tudo isso ao mesmo tempo, na mesma
rodinha de conversa. Sempre aos gritos. Sempre terminando em piadas que seriam
repetidas à exaustão pelos próximos anos independente da qualidade. Sempre
igual.
Quando o professor se atrasava,
ficávamos contando os segundos para podermos considerá-lo ausente e então
fugíamos para o shopping, onde todo mundo emprestava dinheiro para todo mundo
comprar comida, e eu muitas vezes gastava mais do que deveria. Nunca deixávamos
de passar na livraria, caçando relíquias e comentando sobre as coisas que
queríamos comprar. Nos espremíamos em volta das mesas redondas da praça de
alimentação e passávamos horas falando sobre quase nada de útil. Sempre igual.
Ficávamos andando sem rumo nos
intervalos, e às vezes íamos comprar chocolate só para ter o que fazer. Depois sentávamos
em um cantinho aleatório e conversávamos sobre qualquer coisa todo o resto do tempo. Discutíamos muito, ríamos muito, falávamos de tudo e trocávamos muitas confidências. Sempre.
Reuníamo-nos para discutir os
trabalhos e tínhamos que nos esforçar para manter o foco. Eu levava broncas por
ficar me afligindo, e distribuía broncas nos outros por não ficarem.
Discutíamos incessantemente, pedíamos a opinião de todo mundo, perguntávamos
para quem já tinha feito, e dificilmente chegávamos a um acordo que deixasse a
todos contentes. Sempre.
Sempre havia com quem tirar dúvidas
nos momentos de aflição, seja nas questões de física ou nas existenciais.
Sempre havia com quem conversar sobre absolutamente qualquer coisa. Sempre havia
alguém que entendia aquela piada bastante específica. Sempre.
E
outra coisa que sempre fazíamos era reclamar. Reclamávamos da rotina.
Reclamávamos dos professores. Reclamávamos dos trabalhos. Reclamávamos das
pessoas. Reclamávamos da universidade. Reclamávamos. Dissemos um milhão de vezes que
não víamos a hora de acabar.
Mas é fácil reclamar quando se tem
tudo isso todos os dias. Quando temos
que passar todas as tardes da semana durante mais de quatro anos ao lado das
mesmas pessoas, fazendo praticamente a mesma coisa, em um curso que não
gostamos, é mais do que natural ligar no modo automático e deixar de dar valor
mesmo a parte boa daquilo que se vive diariamente.
O curso acabou, mas continuo vivendo uma rotina maluca e infeliz. A principal diferença entre a de agora e a de antes é que não tenho mais aquele grupo de pessoas com quem dividi-la. Posso ver, finalmente, que esses mais de quatro anos da minha vida
presa na mesmice infinita não foram uma completa perda de tempo por causa
das pessoas com quem os compartilhei.
Nunca gostei de finais, mas nesse
caso, era para ser diferente. Mal podia esperar para me formar desde antes de chegar ao
meio do curso. Minha aversão a encerramentos, no entanto, voltou com força total agora que atingi o objetivo. Me lembrei de que, todo fim, por mais esperado
que seja, tem seu lado negativo.
Esse lado negativo chama-se “Saudade”.